“E disse o SENHOR a Satanás: Observaste tu a meu servo Jó? Porque ninguém há na terra semelhante a ele, homem íntegro e reto, temente a Deus, e que se desvia do mal- Jó 1:8”.
As experiências vividas por Jó trouxeram um conhecimento de Deus que ele não tinha. A fé conceitual que Jó tinha em Deus até então era a mesma que a dos seus três amigos, um conceito de fé retributiva, que associava o sofrimento ao pecado, uma espécie de legalismo (Hoje, Jó seria definido como uma pessoa religiosa). Ele esperava que Deus “agiria” a partir daquela fé. Jó já era justo e reto diante de Deus, o que mais Deus queria dele? Neste artigo vamos a esta e a outras respostas no aspecto da fé.
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A fé de Jó
O conflito de Jó em relação a Deus estava no porquê e na causa do sofrimento, e não no sofrimento em si. De acordo com a sua crença, não havia motivo para ter tal sofrimento – ele não merecia e era injusto (13: 15-18). Mas Jó sabia que Deus não era injusto, que ele próprio era justo, (não tinha cometido pecado) e sabia que tanto o bem como o mal “vinham” de Deus (2: 9). No entanto, baseado naquela fé, estas certezas não respondiam à causa do sofrimento. A ignorância sobre Deus o levou a uma fé desfocada, em um deus irreal e impessoal. A causa do sofrimento estava no interesse de Deus em que Jó desenvolvesse um conhecimento diferente do que tinha até então – O de ouvir sobre Deus. Jó se arrepende, não por “um pecado” que lhe tenha trago sofrimento, mas por condenar e culpar a Deus ao se justificar (13: 23. 38: 2. 40: 8). Não foi Deus que se ajustou a fé de Jó, foi Jó que ajustou sua fé em Deus (42: 3, 5, 6).
Jó e o cristão
Jó tipifica o cristão, e a sequência de acontecimentos e situações circunstanciais na vida retratam a caminhada espiritual cristã a partir do Jó do início e do Jó do final do livro. A individualidade de Deus com cada cristão, como as questões da vida, o aproxima ou não de Deus. O quanto Deus permite ser conhecido por seus filhos e os meios para isso, segue uma sequência representada na história de Jó. As angústias, aflições e sofrimento pelos quais Jó passou se repetem com os cristãos hoje, ainda que difiram em semelhança e intensidade não são menos significativos e necessariamente importantes. Nenhuma das adversidades pelas quais Jó passou foram criadas por Deus, houve uma causa explorada por Satanás com permissão de Deus para um (bom) propósito. O maior benefício para Jó foi ter tido um verdadeiro conhecimento de Deus.
O livro mostra de forma representativa, a partir do próprio Jó, a individualidade do crente em relação a Deus e a relação que Deus deseja ter com seus filhos. Assim como em Jó, o cristão pode ser afetado (com permissão de Deus) nas esferas da vida representada na história: material, financeira, familiar, social, físico, emocional e espiritual e nada além. [Uma observação interessante neste sentido foi a mulher de Jó não ter sido tirada dele. Nenhuma provação de Deus, seja por qual o motivo for justifica ou intenciona a dissolução de um casamento].
A intenção de Deus
A intenção de Deus ainda hoje, como foi com Jó, é resgatar o ser humano das convicções pessoais e terrenas, das distorções da fé, possibilitando um conhecimento real e pessoal com Ele.
Deus deu testemunho de Jó porque Deus o conhecia– II Tm 2: 19. As características do caráter de Jó testificadas por Deus são as mesmas relacionadas ao cristão hoje. Jó é uma figura representativa do cristão de todos os tempos. Deus trata cada filho individualmente não coletivamente. Para Deus, cada cristão, assim como Jó, é íntegro, reto, temente e único (ninguém há na terra semelhante a você leitor).
Todo cristão é um Jó, e terá seu dia. Em algum momento Deus vai retirar a proteção que tem livrado seus filhos de um ataque mais direto de Satanás, para que, tenha a possibilidade de desenvolver um relacionamento ainda mais íntimo com Ele, revendo os conceitos ajustando a fé, o conhecendo cada vez mais. Foi a partir de todo conflito pelos quais passou que Jó teve uma visão crítica da própria fé em relação a Deus.
Embora a fé de Jó em Deus fosse deficiente, ele sabia que Deus era justo e bom. É como saber que uma cidade perfeita existe e não saber exatamente como ela é, como funciona ou como ter acesso a ela. Deus não despreza nenhuma fé… Ele tem caminhos para aproximar seus filhos.
Satanás utiliza a mesma artimanha hoje, induzidos muitos, a partir de uma fé distorcida (centrada nos próprios interesses e vontades), à conclusão de que ser cristão não “compensa” pelo tanto que se sofre, pelas perdas e renúncias em nome da integridade e da retidão.
A intenção de Satanás
A intenção de Satanás (e hoje não é diferente)era impedir que Jó chegasse a um real conhecimento de Deus; convencê-lo de que Deus não se importa com determinadas atitudes morais; que não precisa ser tão inflexível quanto a alguns detalhes de caráter. Se o que se deseja não é ilícito, mas contribuiria para a felicidade, por que Deus não dá? permite ou realiza? Se a fé não corresponde àquilo que se crer, (neste caso), qual é o sentido de ser íntegro reto e fazer o certo? Qual é o sentido da fé? Se na busca pela felicidade os meios empregados não forem de “tudo errados ou ilícitos”, não seriam justificáveis? Se Deus quer a felicidade de todos onde estaria o erro? E assim muitos naufragam na fé. Isso fica evidente na fala da mulher de Jó ecoando hoje em coro com Satanás: “Ainda mantém a tua integridade…? De que vale ser íntegro (?)”.
O erro estaria na recusa persistir em conhecer a Deus, que por situações e circunstâncias adversas, possibilita que se possa ter um conhecimento de si, da própria fé e chegar a um real conhecimento de Deus. Deus não será conivente com uma crença que não corresponda com quem Ele é e, com o que Ele quer. Deus não vai endossar uma “felicidade” que não tenha base nEle, em detrimento do que é mais importante para cada criatura: a vida eterna.
A fé cristã
Jó sabia que Deus era justo, que o problema não podia estar em Deus em relação a ele, mas nele em relação a Deus. Associar a fé à benção ou à maldição é um perigo além do erro. A fé em Deus não deveria questionar tanto em que se tropeça, mas o porquê se tropeça. Será a escuridão que impede ver àquilo em que se tropeça ou são os olhos que estão fechados para aquilo em que se tropeça?
Para Deus, não basta não pecar como num regime legal de condutas. O que difere o cristão de bom caráter moral, do não cristão de bom caráter moral está na comunhão pessoal ou não com Deus (legal ou pessoal). O que propicia esta relação vai além da ausência do pecado do “fazer ou deixar de fazer, desta ou daquela forma”, é a relação pessoal, resultado do quanto se conhece a Deus, na medida em que Ele se dá a conhecer, que produz fé e segurança.
Então, não compensa ser íntegro? Sempre compensa ser reto, integro e fiel, no entanto, estes valores, por si só, não subordinam Deus ao mais fiel dos homens.
Se a (nossa) fé não corresponde ao “Deus” em que se crer, talvez a fé esteja baseada em um conhecimento irreal de Deus. Jesus é a revelação máxima de Deus para todas as pessoas em todos os tempos. Jesus é o único meio e possibilidade de conhecer a Deus como ele se dá a conhecer e ter comunhão com ele. Renasce-se para Deus quando se morre para as próprias convicções e conceitos do é certo, justo e verdadeiro. A busca por conhecer a Deus, a perseverança na fé em Deus, foi o que levou Jó a conhecer a Deus como Ele deseja ser conhecido. Jó, já era justo e reto, diante de Deus, o que mais Deus queria dele? Um relacionamento pessoal e hoje ainda é assim.
“Pois, que aproveitaria ao homem ganhar todo o mundo e perder a sua alma? Mc 8: 36”.
Idevaldo L. Santos